segunda-feira, novembro 26, 2007

O terceiro aniversário de Tetê: a última impressão, a derradeira impressão sobre o cérebro (dele)

Tetê resolveu fazer um teste com ela mesma: até que ponto tinha dignidade? Até que ponto poderia aceitar dividir o ser esquisito com uma fêmea da mesma espécie dele, ou seja, esquisita?
---
Lá vinha outro aniversário, lá foi ela telefonar e intimar para ele passar a meia-noite com ela. Ele responde é lógico e ela espera. Nenhuma produção como na primeira vez. Ela esperou de jeans e camisa branca. Encomendou Steak au Poivre do Old West, prato preferido deles.
---
Conversaram sobre a fêmea esquisita e minúscula dele, e sobre o deus grego, que Tetê tinha voltado a encontrar com freqüência. Tudo muito morno. Saborearam a comidinha e o champagne. Tudo muito morno Lentamente passaram para a maravilhosa Old West Dessert (maças picadas ao creme, nozes, castanhas, passas, ameixas e mel...). Tudo muito morno. Tiveram um capuccinho cheinho de espuma. Tudo muito morto. E foram para a cama. Tudo muito morno. O celular dele tocou as duas da manhã e ele disse que precisava ir embora. Tudo muito morno.
---
Ele saiu e Tetê encheu a banheira com sais, espumas e água morna. E ali, de molho, cercada das velas que não tinha tido inspiração para acender durante o jantar e uma nova garrafa de champagne, Tetê caiu num choro lento, demorado, sentido, dolorido. Vasculhou sua mente e não localizou um momento anterior da sua vida, em que tivesse chorado desta forma.
---
Relembrou as loucuras dos primeiros encontros, as sensações maravilhosas que eles dividiram juntos, as risadas, as loucuras, os apertos, as saias justas. Lembrou de três anos de dedicação por um homem que sequer sabia que ela existia. Lembrou do quanto ele era dominado pelas mocinhas bonitas, pelas adolescentes esquisitas e cheias de espinhas, pelos hormônios, pela super-mãe, pelas aparências, pelas opiniões, pela urgência de viver a vida feito um adolescente.
---
Ele era, sem dúvida, um ser não somente esquisito mas em estado permanente de sumiço. Ele sumia aos poucos, extremamente desalinhado do mundo e distante da coerência, pressionado por valores e indivíduos dos quais era dependente, de uma forma ou de outra. Ele era um ser que precisa se entregar a qualquer um que o pressionasse, para que pudesse enfim, sair correndo dali. Ele vivia em busca de justificativas e incentivos para seus sumiços. Ele implorava para ser colocado na parede, pois só assim conseguia sair com a consciência tranqüila e jogar a responsabilidade dos finais nos ombros alheios. Ele coloca o próprio cérebro e o próprio corpo nas mãos do outro, sempre, e seduzia a todos para que o apertassem. Então, olhava bem dentro dos olhos do outro e dizia:
- Eu avisei que odiava ser pressionado. Você arriscou e me perdeu, estou indo embora por sua causa.
---
Tetê visualizou o cérebro dele, o corpo dele, a lembrança dele e o amor que sentia por ele exatamente assim... sumindo, sumindo aos poucos e com um silêncio apertado, sufocante. Um silêncio que ela não estava sabendo trabalhar.

Nenhum comentário: