terça-feira, outubro 28, 2008

Sobre livros e leituras sensatas

Aconteceu assim, uns três anos atrás aproximadamente. Um domingo escaldante de verão e Tetê acorda cedo com o telefone tocando. Conversa um pouquinho com um amigo distante e de repente lembra que há uma feira de livros na cidade. Preguiçosa, toma uma banho e sai extremely casual: cabelos molhados, sandália rasteira, jeans e regata de seda. Ah! E óculos do tipo "saída de motel", enorme, atrás do qual ninguém a reconheceria assim tão básica.

Tetê entra em todos os stands de livros e já está suficientemente carregada quando entra no último: aqueles que vendem livros interessantes a preços "nórdicos" (o termo é da diarista, que se autodenomina "analfabética". Por que será???). Fuça daqui, fuça dali e Tetê está definitivamente coberta por livros num dos braços quando avista um antigo sonho de consumo.

Explica-se o sonho de consumo: ela sempre quis esse livro, mas morria de vergonha de entrar numa livraria para procurá-lo, imaginando que alguém conhecido pudesse aparecer subitamente e fazer algum juízo errado sobre ela. Afinal, porque uma mulher como ela compraria "Mulheres Inteligentes, Escolhas Insensatas"??? Nem morta que Tetê pagaria esse mico.

Mas naquela feira, com aquela roupa e aqueles óculos, num stand de livros populares... era uma ótima oportunidade para realizar o sonho antigo. Tetê olhou para um lado, olhou para outro, olhou para trás e se certificou de que absolutamente ninguém por ali poderia lhe reconhecer. E traçou uma estratégia infalível: ela estenderia o braço livre como quem não quer nada em particular. Esbarraria no exemplar secretamente, ardentemente, urgentemente desejado e o faria deslizar para o meio da montanha de livros que empilhava no outro braço. Nada poderia sair errado! Era um plano perfeito! E ela deu iniciou a perigosa e excitante operacionalização de seu plano. E no exato momento em que o livro estava no meio do trajeto entre a prateleira e seu braço dolorido pelo peso, alguém exclama atrás dela:
- Poxa! Sempre quis conhecer uma mulher que se interessasse por esse livro!

Tetê fica roxa. Não há a mínima possibilidade de fazer o tempo voltar para o momento em que ela ainda não tinha alcançado o maldito livro. Alguns milésimos de segundos dramáticos se passaram sem que ela pudesse pensar em uma desculpa descolada. Então o jeito era olhar para trás e encarar o dono daquela voz, e da acusação implícita que a voz trazia. E aí foi outro susto... o dono da voz era um homem imeeeeenso, liiiiiindo, grisaaaaaalho, e vestia uma camisa Elle et Lui impecável. Ela não conseguiu balbuciar nenhum som, e ele percebendo o mal estar, foi direto ao assunto:
- Fazemos o seguinte... você me dá o seu telefone e me explica porque está comprando esse livro, combinado?

Tetê imaginou que um encontro nessas condições só poderia resultar em um desastre e gaguejando deu um número de celular que já não existia. Ele agradeceu, sorriu e disse que ligaria no dia seguinte para combinar um jantar e discutir sobre o livro. Ela pagou o maldito livro, voou para casa e amaldiçoou a compra com todas as suas forças. Afinal, o livrinho tinha empatado uma possível "escolha sensata" com um homem pra lá de charmoso.

Outro dia Tetê estava na livraria esperando o Beto sair do Pet. Em um dos braços, livros e mais livros (biografia de Madame Curie, um ensaio de Mário Schenberg, textos de Washington Olivetto, biografia de Cartola e cartas de Vinícius de Moraes. Graças aos céus, uma boa seleção dessa vez...) quando alguém derruba um livro atrás dela e ela se volta para ajudar. Lógico! Era aquele homão da feira de livros! Eles riem, ele analisa os livros dela e reclama que o celular que ela anotou não existia.

Os dois assim, meio sem graça, e ele pergunta se ela realmente leu o livro. Ela fica meiga de repente, até que ele faz a segunda pergunta: se ela aprendera a fazer "escolhas sensatas". Ela já não se sente tão meiga. E ele faz a terceira pergunta: qual o número verdadeiro do celular.

P da vida, ela responde as três perguntas de uma vez:
- Sim, eu li o livro, aprendi a fazer "escolhas sensatas",e é por isso que não lhe dou meu telefone verdadeiro, darling.

Virou furiosa e andou sem olhar para trás. Aliás, faz tempo que Tetê está andando sem olhar para trás e isso traz uma elegância inigualável. Insuportável...

sexta-feira, outubro 17, 2008

Falando em anonimato...

Tetê estava em casa perto das 10 da noite, de camisolinha, quase dormindo abraçada a um livro chato, quando ouviu a campainha. Campainha? Como alguém consegue passar pelos cães de guarda que são os porteiros e alcançar a campainha assim, diretamente, sem interfone? Talvez fosse uma vizinha querendo papo e ela resolveu abrir.

Por alguns instantes, pensou que estivesse no meio de um pesadelo: na sua frente, três monstros coloridos fazendo muuuuito barulho. Ela tentou fechar a porta, mas um dos monstros colocou o pé no caminho, forçou a porta e abraçou Tetê enquanto os outros dois entravam e tentavam imobilizar um Beto Grude Gabbana que, em pânico, pulava de um lado para outro uivando. E de repente, no meio do pavor, vozes conhecidas... Sim, sim, sim... eram três amigas loucas, fantasiadas, excitadíssimas e já meio bêbadas. Tetê recupera o Beto do colo de uma bruxa roxa, senta no chão e tenta entender o que as três malucas diziam.

Simples assim: elas foram convidadas para uma festa à fantasia e sentiram saudades da amiga sumida. Tetê estava intimada a ir com elas. Ela tentou explicar com a maior calma que estava cansada, era tarde, ela não tinha nenhuma fantasia em casa e o Beto estava tomado por um surto psicótico depois do susto, mas elas não desistiriam tão fácil.

Reclamaram, xingaram, argumentaram que Tetê estava um pé no saco com as historinhas de caixa preta, piscininha de mil bolinhas, namoradinho e afins, e tinha abandonado cruelmente as amigas. Enquanto reclamavam, Ângela – a bruxa roxa – retoma o Beto (ai, judiação....). Carminha – a sereia dourada – invade o banheiro e volta com caixas de maquiagem e Vera – uma espécie de monstro negro do pântano – abre o guarda-roupa de Tetê e arremessa alguns possíveis vestidos em cima da cama.

Impossível resistir! Mesmo porque a promessa de uma diversão com várias pessoas juntas era um bálsamo para a vida reclusa, digamos assim, que Tetê vinha levando nos últimos meses. E menos de trinta minutos depois, Tetê está num longo azul, com uma coroa na cabeça e algumas flores pregadas na barra. Uma mistura de Scarlett, Cinderela, Iemanjá e Pastorinha, mas foi o que conseguiram para o momento supremo, e assim foi Tetê.

A festa acontecia numa casa maravilhosa, Tetê chegou a duvidar que estivesse em Curitiba. Pessoas lindas (continuou duvidando...), fantasias lindas, bebidinhas lindas, comidinhas lindas, tudo lindo. O dono da casa veio cumprimentá-las e ganhou a confiança da Tetê quando perguntou meigamente "um uisquinho? um bourboun?" Ah... lá foi Tetê com o Jack Daniel's! E quatro Jacks depois, Tetê estava se esbaldando na pista de dança, esquecendo completamente da Cinderela e Cia. Ltda. A maioria das pessoas estava de máscaras, o que era sem dúvida, divertido e inebriante. E ela dançou muuuito com um mascarado que tinha uma voz incrível e cantava! Tetê sempre achou um charme homens que cantam enquanto dançam. Mas de repente... a luz se fez!!! Não, não foi a consciência, foi o sol mesmo. Amanhecia quando Tetê ainda dançava com o mascarado e via os três monstros que a capturaram encostados uns nos ombros dos outros, num banco do jardim, roncando!

Jogada na banheira, com uma caneca de café preto fortíssimo, e tentando se preparar para enfrentar um dia de trabalho direto, Tetê chegou à conclusões dinâmicas: o anonimato é mesmo lindo; ela não foi feita para ficar parada e longe das multidões; definitivamente, não se fazem mais monstros, fantasias e "fantasia" como antigamente e, como última conclusão... precisa ter muita, mas muita competência para usar uma máscara. Sem perder o charme e a dignidade...

terça-feira, outubro 14, 2008

O charme, a dor e a delícia do anonimato

Os dias frios e cinzentos estão indo embora, o que significa que Tetê está num movimento magnificamente inverso! Ela consegue acordar cedo, sentar no chão com o Beto enquanto ele devora um mix de mamão, maçã e banana (verdade, ele enlouquece com as refeições matinais que a "pediatra" liberou), ler todos os jornais, passar alguns minutos na bicicleta que não sai do meio da sala (mas é enfeitada com uma manta de fios deslumbrante da designer mais que deslumbrante Márcia Ganem), e mesmo quando deveria se sentir absolutamente exaurida com essas árduas tarefas, consegue sair de casa leve, solta e saltitante.

No elevador ela cumprimenta efusivamente dois vizinhos carrancudos que resmungam algo como "om ia". Lógico! Dizer um "bom dia" completo é uma utopia para qualquer bom vizinho curitibano! Mas Tetê nem liga, continua bem humorada e esvoaçante na blusa de camadas levíssima que escolheu para saudar um calorzinho. Engraçado mesmo é que na horinha de escolher uma sandália, um pensamento trágico, urgente mesmo, lhe passou pela cabeça: ela precisa de novas sandálias! A galeria colorida na sua frente não é suficiente, como sempre. Nem a sandalinha de cristal para encontrar lobos maus legítimos podia satisfazer esse tipo de desejo – o de uma sandalinha nova.

O dia passou, ela fechou um negócio interessante e saiu do escritório mais cedo. Andou a pé pelas ruas, viu vitrines, consultou um conselho de amigas pelo celular para saber as últimas fofocas, contratou um eletricista para trocar todos os spots do quarto enquanto experimentava uma calça bárbara na Le Lis, e... de repente... lembrou: calor, horário de verão, outubro.... aniversário! Ela estava quase fazendo aniversário! Well. Tirando o fato de que mudar de número é complicado tooooodos os anos, isso era um bom sinal. Sinal de festa à vista, de reunir gente gostosa, de apagar velinhas, de se divertir muuuuito! E para compensar o peso da idade, se deu de presente o primeiro item: a calça bárbara.

Uma pontinha de remorso depois, comprou uma centopéia para o Beto (inimaginável ela ter um presente e ele não!) e voou para casa para vê-lo abrir o pacote. Na portaria, um pacote sem remetente. Enquanto o Beto tentava devorar a caixa da centopéia, ela devorou o papel dourado do seu próprio pacote. Nenhum cartão, nem uma dica, nem uma pista. Se duvidar, nenhuma impressão digital. Mas em compensação, uma sandália dourada simplesmente estonteante, que servia!!! Exatamente o seu número...

Tetê pegou emprestada a centopéia do Beto e deu uma mordida. Uma coisa ela aprendeu nessa vida: nunca, nunca, nunca, nunquinha mesmo, passar a mão no telefone e perguntar toda alegrinha: "Foi você?"

Tetê continuará a morder a centopéia. Continuará a morder o Beto. E continuará a se morder de curiosidade. Mas jura de pés juntos (calçados com a sandália dourada nova, claro!) que vai esperar alguém se manifestar. Melhor do que sair por aí dando montanhas de foras e despertando sentimentos bélicos em todo mundo que responder "Fui eu o quê?"


segunda-feira, outubro 06, 2008

Enquete da Tetê: responda rápido... você faria o que?

Você está andando na rua, chiquérrima com um tubinho Versace preto. Láááááá na esquina você avista um lobo mau. Ele vem andando firme em sua direção, você está congelada de pavor e começa a suar frio. A menos de um metro de você ele sussurra gentilmente: Você é diferente de todas as mulheres que já conheci.

Você está encantada com um homem. Ele é durão, macho pra caramba, irredutível, preso nos parâmetros mais machistas da humanidade. Você resolve agradá-lo, dá uma de Luma de Oliveira, compra uma coleira de cristal Swarovski caríssima com o nome dele gravado, e estréia metida num vestido vermelho francês com uma fenda na perna direita que mais parece a Garganta do Diabo. Ele olha bem dentro dos teus olhos e diz que odeia mulheres submissas.

Você não sabe cozinhar nada. Nadinha mesmo. E tem a nítida impressão de que panelas e fogões vão criar milhares de tentáculos carregadinhos de um veneno mortal que dispara se você chegar perto demais. Mas tem um homem pra lá de charmoso que você ju-ra que merece uma massa básica. Heroicamente você se enfia na cozinha e durante 30 longos minutos vê aquela água ferver, aquele macarrão se desmantelar todo e aquele molho ficar ali, borbulhando de uma forma indecente, torturante. Ele prova e diz que o molho tem que ser colocado só no final, para não ficar ácido daquele jeito.

Você está detonada. Semana cheia, reuniões intermináveis, agendas neuróticas e limite do cheque especial estourando. Todos os cartões de crédito entraram em greve. Seu cabelo implora por uma boa escova de chocolate e você não tem tempo de atendê-lo. Os jatinhos da hidromassagem pifaram quando você mais precisava deles. Mas... ele vem! Ele vai te colocar no colo, vai te dizer que tudo isso vai passar, que vai cuidar de você, que naquela noite vai te fazer esquecer do mundo! E ele chega! Cheiroso, lindo. Você ainda está irritada. Ele liga a TV para não perder uma luta de Box. Logo em seguida, ele dorme.

Seu cachorro voltou do Pet com um corte horroroso. Desesperada, você passa a mão na tesoura e corta o lado direito do bigode dele. Quando tenta o lado esquerdo, o cachorro surta, uiva, corre pela casa inteira, derruba dois vasos de orquídeas e não te deixa mais chegar perto nem com reza brava. Um homão atencioso chega na sua casa, olha para o seu cachorro e diz que ele está uma gracinha. E não nota que o seu cabelo também diminui 1,5 cm, pois nos únicos 20 minutos de sobra do dia, foi o que deu para fazer no salão.

Você explica pra ele uma situação delicada, profunda, repleta de detalhes imprescindíveis, de entendimento realmente difícil. E lógico que cada palavra que descreve cada detalhe imprescindível, é imprescindível ao quadrado. Ele não entende e você desenha. Ele responde com uma frase lacônica que faz alusão ao único (dos trezentos e vinte e oito) assunto que você não abordou.

Responderam?

Ah... e ainda querem saber o porque do sapatinho de cristal no início da postagem? Não. Não é da Cinderela não. É um exemplar Alexander McQueen legítimo. Porque é exatamente o que Tetê faria... colocaria um sapatinho de cristal pra lá de básico, ligaria para umas amigas descoladas e sairia... estrada afora. Que nem Chapeuzinho Vermelho em busca de lobos maus nativos. Legítimos mesmo. Furiosos. Esfomeados. Sedentos. Arrebatadores. Maus. Muuuuito maus.