quinta-feira, novembro 15, 2007

O candidato a yuppie e a coroa enxuta

O mundo verdadeiramente tinha acabado e Tetê sentia o peso deste final. Dormia e acordava chorando, não queria sair da cama, não queria comer, não queria falar com ninguém, não queria trabalhar. A super-mãe não parava de telefonar e de dizer o quanto se sentia culpada por ter "falado demais". Mas isso não importava, o que doía era ficar sem ele. Os motivos não mudavam o fato.
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Uma semana depois do desastre, a secretária do ser esquisito telefona e convida Tetê para sair. Estranho, mas o que não era estranho naquela situação? A menina tinha uns 22 anos aproximadamente e por alguns instantes Tetê pensou que um ar de juventude pudesse lhe fazer bem. Marcaram num barzinho, extremely young. Escuro, escuro, escuro, num porão... rock, rock, rock e muito whisky nacional. Tetê pediu uma cerveja, depois outra, depois outra. A música e o ambiente lembravam o ser esquisito: todo mundo de cabelo comprido, roupas muuuuito casuais, todo mundo "doidão". A menina disse à Tetê que um amigo estava interessado em conhecê-la, e Tetê concordou. Concordava com tudo naquele estado de embriaguez estúpida em que estava.
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O garoto chega perto dela, faz um cumprimento esquisito com as mãos estaladas no ar, e solta um e aí, mana, como é que tá? Tetê diz que está ótima, pede desculpas e levanta. O garoto pergunta aonde ela vai, e como não tinha muito lugar para ir naquele porão, ela diz que vai ao banheiro. O garoto se oferece para entrar com ela!!! Tetê dispensa o que considerou um cuidado geriátrico absolutamente desnecessário, entra num banheiro horrível e decide que precisa sair do porão naquele instante.
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Volta para a mesa para se despedir e pagar a conta, mas o garoto já tinha pago as trocentas cervejas consumidas, e oferece uma carona. Tetê olha mais atentamente aquela coisa jovenzinha: ele era um estudo de yuppie. Um encarada de cima a baixo revela (pelo menos!) uma calça Ellus e uma camisa da Triton. Menos mal... e Tetê aceita a carona. O que ela tinha a perder?
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O candidato a yuppie pergunta se pode subir. Pode. No elevador, pergunta se pode dar um beijo. Pode. Mas no fundo não pôde não, pois Tetê começou a sentir a cerveja embolando seu estômago. Entra em casa feito uma louca e vai direto para o banheiro, naquela situação em que perua alguma quer ser vista, nem em caso de vida ou morte. Mas o menino, bonzinho, entra no banheiro e segura sua cabeça!
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Tetê agradece, pede desculpas pelo vexame, diz que ele é uma gracinha, mas que seria melhor esquecer tudo aquilo e tenta mandá-lo embora. Ele não quer ir. Tetê explica que é muito velha pra ele, que ele merece coisa melhor. Ele não quer ir. Tetê explica (desenha...) que está muitíssimo enjoada e que qualquer coisa que necessite de "movimento" não daria certo naquele momento, quem sabe outro dia. Ele não quer ir. E, muito seriamente, ele balbucia:
- Você é uma coroa enxuta, e meu sonho é ter uma namorada assim, que more num apartamento assim, bonito como este.
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Tetê se irrita, manda o menino para o inferno, deita na cama com aquele magnífico terninho de seda branca (já destruído) e pega no sono. Abre os olhos com o sol entrando pela janela e lembra da noite anterior, gargalhando sozinha. E morre de susto: no seu chão de cerâmica branca e fria, aos pés da sua cama, todo enroladinho em posição fetal, está o garoto!!! Só havia uma coisa a fazer e Tetê fez com todo o rigor... amassadíssima naquele terninho ex-branco, cutucou o garoto com o pé até ele acordar. E disparou:
- Coroa enxuta é a sua vovozinha. E voe para a sua casa, antes que eu ligue para a sua mãe!

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